23/10/2014 2124c
A causa indgena nunca foi resolvida no Brasil. A toda hora se ouvem invases de terras indgenas para dar lugar ao agronegcio. Homologao de suas terras so proteladas. E h assassinatos e suicdios misteriosos entre os guarani.
No obstante, deram-se alguns avanos que cabe reconhecer como a demarcao e homologao em rea contnua da terra Yanomami contra a presso de meia dzia de arrozeiros, apoiados pelo latifndio pelo agronegcio; a devoluo da terra indgena xavante Mariwatsd na Prelazia de So Felix do Araguaia, de onde haviam sido arrancados fora h 40 anos atrs. A mesma coisa no ocorreu com a terra dos Guarani Kaiow, Guyraroka, que o STF com os votos dos ministros Celso Mello e Carmen Lcia rejeitaram o voto de relator do processo o ministro Ricardo Lewandoski. Em nenhum momento a comunidade indgena foi consultada e o latifundirio que as ocupou, ganhou o direito sobre os 12 mil hecatares das terras tradicionais.
Casos como estes so frequentes, por mais que a Funai e o CIMI (Centro indigenista missionrio da Igreja Catlica) se empenhem em sua defesa. Neste contexto vale recordar O Manifesto da Comisso Indgena 500 anos (1999) expressando o clamor de 98 diferentes povos originrios. Eles denunciaram com veemncia:
?Os conquistadores chegaram com fome de ouro e de sangue, empunahando em uma das mos armas e na outra a cruz, para abenoar e recomendar as almas de nossos anteados, o que daria lugar ao desenvolvimento, ao cristianismo, civilizao e explorao das riquezas naturais. Estes fatores foram determinantes para o extermnio de nossos anteados?.?
?O dia 22 de abril de 1500 representa a origem de uma longa e dolorosa histria?Afirmamos nossa divergncia clara e transparente com relao s comemoraes festivas do V centenrio, por atentar e desrespietar nossos anteados, mortos em defesa de seus filhos, netos e geraes futuras. E por negarem nosso direito vida como povos culturalmente diferenciados??
?Pretendemos sim, celebrar as conquistas ao longo dos sculos, plenas de heris annimos, que a histria se nega a reconhecer. Celebramos sim, as vitrias que nos custaram tantas vidas e sofrimentos, porm trouxeram a determinao e a esperana de um mundo mais humano, de solidariedade?.
?Celebraremos tambm o futuro, herdeiros que somos de um ado de valorizao da vida, de ideais, de sonhos deixados por nossos anteados. Apesar das desigualdades e injustias, estamos cientes da importncia de contribuir para a consolidao de uma humanidade livre e justa, aonde ndios, negros e brancos vivam com dignidade?(Jornal do Brasil de 31 de maio de 1999). Na campanha presidencial nunca se abordou com seriedade esta demanda histrica dos indgenas.
O que poderamos esperar dos portugueses que durante quinze sculos aram pela educao crist? Que ao verem aqueles belos corpos na praia, espreitando curiosamente a chegada das caravelas, exclamassem: ?Que bom! Descobrimos mais irmos e irms. Vamos abra-los e beij-los como membros da grande famlia de Deus, representantes diferentes do corpo mstico de Cristo?. Nada disso ocorreu.
Depois do primeiro encontro pacfico, cheio de lirismo descrito pela carta de Pero Vaz de Caminha, tudo mudou. Vieram com a cobia pelas riquezas da terra. Moveram-lhes guerras, chegaram a negar-lhes a humanidade e, apesar de sua inocncia e bondade natural, atestadas por todos os primeiros missionrios, consideraram-nos faltos de salvao. E os subjugaram e os batizaram sob medo.
Alguma coisa falhou no processo de educao e de evangelizao dos europeus, notadamente dos espanhois e dos portuguses que impediu que ocorresse verdadeiramente um encontro de pessoas e de culturas. O que houve foi uma negao pura e simples da alteridade.
O assim chamado ?descobrimento? equivaleu a um encobrimento e a um apagamento do outro, da histria dos povos originrios do Brasil e de Africa. Tambm no significou um ?encontro? de culturas mas uma invaso. O que de fato ocorreu foi um imenso desencontro, um verdadeiro choque de civilizaes com o submentimento completo dos negros e dos indgenas mais fracos. At hoje fica a marca deste ato fundacional nas formas como discriminamos os indgenas, no respeitando suas terras sagradas e mantendo preconceitos contra os afrodescentens, aqueles que construiram quase tudo do Brasil.
Edio 1634
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