28/07/2014 4m41l
Analisamos no artigo anterior, as ameaas que nos traz a transformao da economia de mercado em sociedade de mercado com a dupla injustia que acarreta: a social e a ecolgica. Agora quermos nos deter em sua incidncia no mbito da ecologia tomada em sua mais vasta acepo, no ambiental, social, mental e integral.
Constatmos um fato singular: na medida em que crescem os danos natureza que afetam mais e mais as sociedades e a qualidade de vida, cresce simultaneamente a conscincia de que, na ordem de 90%, taisdanos se tributam atividade irresponsvel e irracional dos seres humanos,mais especificamente, quelas elites de poder econmico, poltico, cultural e meditico que se constituem em grandecorporaes multilaterais e que assumiram por sua conta os rumos do mundo. Temos, com urgncia, fazer alguma coisa que interrompa este percurso para o precipcio. Como adverte a Carta da Terra: ?ou fazemos uma aliana global para cuidar da Terra e uns dos outros, ou arriscamos a nossa destruio e a da diversidade da vida?(Prembulo).
A questo ecolgica, especialmente aps o Relatrio do Clube de Roma em 1972 sob o ttulo ?Os Limites do Crescimento? tornou-se tema central da poltica, das preocupaes da comunidade cientfica mundial e dos grupos mais despertos e preocupados pelo nosso futuro comum.
O foco das questes se deslocou: do crescimento/desenvolvimento sustentvel (impossvel dentro da economia de mercado livre) para a sustentao de toda a vida. Primeiro h que se garantir a sustentabilidade do planeta Terra, de seus ecossistemas, das condies naturais que possibilitam a continuidade da vida. Somente garantidas estas pr-condies, se pode falar em sociedades sustentveis e em desenvolvimento sustentvel ou de qualquer outra atividade que queira se apresentar com este qualificativo.
A viso dos astronautas reforou a nova conscincia. De suas naves espaciais ou da Lua se deram conta de que Terra e a Humanidade formam uma nica entidade. Elas no esto separadas nem juxtapostas. A Humanidade uma expresso da Terra, a sua poro consciente, inteligente e responsvel pela preservao das condies da continuiade da vida. Em nome desta conscincia e desta urgncia, surgiu o princpio responsabilidade (Hans Jonas), o princpio cuidado (Boff e outros), o princpio sustentabilidade (Relatrio Brundland), o princpio interdependncia, o princpio cooperao (Heisenberg/Wilson/Swimme/Morin/Capra)e o princpio preveno/precauo (Carta do Rio de Janeiro de 1992 da ONU), oprincpio compaixo (Schoppenhauer/Dalai Lama) e o princpio Terra (Lovelock e Evo Morales).
A reflexo ecolgica se complexificou. No se pode reduzi-la apenas preservao do meio ambiente. A totalidade do sistema mundo est em jogo. Assim surgiu uma ecologia ambiental que tem como meta a qualidade de vida; uma ecologia social que visa um modo sustentvel de vida e uma sobriedade compartida (produo, distribuio, consumo e tratamento dos dejetos); uma ecologia mental que se prope erradicar preconceitos e vises de mundo, hostis vida e formular un novo design civilizatrio, base de princpios e de valores para uma nova forma de habitar a Casa Comum; e por fim uma ecologia integral que se d conta que a Terra parte de um universo em evoluo e que devemos viver em harmonia com o Todo, uno, complexo e perado de energias que sustentam a vitalidade da Terra e carregado de propsito.
Criou-se destarte uma grelha terica, capazde orientar o pensamento e as prticas amigveis vida. Ento se torna evidente que a ecologia mais que uma tcnica de gerenciamento de bens e servios escassos representa uma arte, uma nova forma de relacionamento com a vida, a natureza e a Terra e a descoberta da misso do ser humano no processo cosmognico e no conjunto dos seres: cuidar e preservar.
Por todas as partes do mundo, surgiram movimentos, instituies, organismos, ONGs, centro de pesquisa, cada qual com sua singularidade: quem se preocupa com as florestas, quem com os oceanos, quem com a preservao da biodiversidade, quem com as espcies em extino, quem com os ecossistemas to diversos, quem com as guas e os solos, quem com as sementes e a produo orgnica. Dentre todos estes movimentos cabe enfatizar o Greenpeace pela persistncia e coragem de enfrentar, sob riscos, aqueles que ameaam a vida e o equilbrio da Me Terra.
A prpria ONU criou uma srie de instituies que visam acompanhar o estado da Terra. As principais so o PNUMA (Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente), a FAO (Organizao das Naes Unidas para a alimentao e a agricultura), a OMS (Organizao Mundial para a Sade), aConveno sobre a Biodiversidade e especialmente o IPPC ( Intergovernamental para as Mudanas Climticas) entre outras tantas.
Esta Grande Transformao da conscincia opera uma complicada travessia, necessria para fundar um novo paradigma, capaz de transformar a eventual tragdia ecolgico-social numa crise de agem que nos permitir um salto de qualidade rumo a um patamar mais alto de relao amistosa, harmoniosa e cooperativa entre Terra e Humanidade. Se no assumirmos esta tarefa o futuro comum estar ameaado.
Leonardo Boff, ecotelogo e escritor
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