20/07/2017 1wl5v
O pressuposto bsico de toda democracia : o que interessa a todos, deve poder ser decidido por todos, seja direta, seja indiretamente por representantes. Como se depreende, democracia no convive com a excluso e a desigualdade que profunda no Brasil.
Verdadeiro o juzo de Pedro Demo, brilhante socilogo da Universidade de Brasia em sua Introduo sociologia:”Nossa democracia encenao nacional de hipocrisia refinada, repleta de leis “bonitas”, mas feitas sempre, em ltima instncia, pela elite dominante para que a ela sirva do comeo at o fim. Politico gente que se caracteriza por ganhar bem, trabalhar pouco, fazer negociatas, empregar parentes e apaniquados, enriquecer-se s custas dos cofres pblicos e entrar no mercado por cima…Se ligssemos democracia com justia social, nossa democracia seria sua prpria negao”(p.330.333).
No obstante, no desistimos de querer gestar uma democracia enriquecida, especialmente a partir dos movimentos sociais de base, proclamando o ideal de uma sociedade na qual todos possam caber, a natureza includa. Ser uma democracia sem fim (Boaventura de Souza Santos), cotidiana, vivida em todos os relacionamentos: na famlia, na escola, na comunidade, nos movimentos sociais, nos sindicatos, nos partidos e, evidentemente, na organizao do Estado democrtico de direito, se costuma dizer. Portanto, pretende-se uma democracia mais que delegatcia que no comea e termina no voto, mas uma democracia como modo de relao social inclusiva, como valor universal (N.Bobbio) e que incorpora os direitos da natureza e da Me Terra, da um democracia ecolgico-social.
Esse ltimo aspecto, o ecolgico-social, nos obriga superar um limite interno ao discurso corrente da democracia: o fato de ser ainda antropocntrica e sociocntrica, vale dizer, centrada apenas nos seres humanos e na sociedade. O antropocentrismo e sociocentrismo representam um reducionismo. Pois o ser humano no um centro exclusivo, nem mesmo a sociedade, como se todos os demais seres no entrassem na nossa existncia, no tivessem valor em si mesmo e somente ganhassem sentido e valor enquanto ordenados ao ser humano e sociedade.
Ser humano e sociedade constituem um elo, entre outros, da corrente da vida. Sem as relaes com a biosfera, com o meio-ambiente e com as precondies fsico-qumicas no existem nem subsistem. Elementos to importantes, devem ser incluidos em nossa compreenso de democracia contempornea na era da nascente geosociedade e da conscientizao ecolgica e planetria segundo a qual natureza, ser humano e sociedade esto indossoluvelmente relacionados: possuem um mesmo destino comum como bem se diz na encclica ecolgica do Papa Francisco “cuidando da Casa Comum” e na Carta da Terra.
A perspectiva ecolgico-social tem, ademais, o condo de inserir a democracia na lgica geral das coisas. Sabemos hoje pelas cincias da Terra e da vida, que a lei bsica que subjaz cosmognse e a todos os eco-sistemas a cooperao de todos com todos, a sinergia, a simbiose e a interrelao entre todos, no a vitria do mais forte.
Ora, a democracia o valor e o regime de convivncia que melhor se adequa natureza humana cooperativa e societria. Aquilo que vem inscrito em sua natureza transformado em projeto poltico-social consciente.Funda o fundamento da democracia: a cooperao, o respeito aos direitos e a solidariedade sem restries. Realizar a democracia significa avanar mais e mais no reino do especificamente humano. Significa re-ligar-se tambm mais profundamente com a Terra e com o Todo.
Isso o ideal buscado. No entanto, o que estamos assistindo nos dias atuais o contrrio: um ataque democracia a nvel mundial e nacional. O avano do neoliberalismo ultrararadical que mais e mais concentra poder em pouqussimos grupos, radicaliza o consumismo individualista e visa a alinhar os demais pases lgica do Imprio norteamericano, solapa as bases da democracia. O golpe parlamentar dado no Brasil se inscreve dentro desse iderio. J no conta a Constituio e os direitos, mas se instaura um regime de exceo onde os juzes determinam a esfera da poltica. Bem disse o cientista poltico da UFMG Juarez Guimares: ”Acho errado chamar Moro de juiz parcial. Na verdade, um juiz corrompido politicamente. Ele est exercendo o seu mandato de juiz de forma partidria, contra a Constituio e contra o povo brasileiro”
Os golpistas abandoram a democracia e a soberania popular em favor do domnio puro e simples do mercado, dos rentistas e da diminuio do Estado. Isso foi denunciado recentemente pelo nosso melhor estudioso da democracia Wanderley Guilherme dos Santos em seu livro, silenciado pela midia empresarial,”Democracia impedida” e pelo citado cientista poltico Juarez Guimares numa entrevista publicada, recentemente, no Sul21.
Ningum pode prever o que vir nos prximos tempos. Se os golpistas levarem at o fim seu projeto de privatizaes radicais a ponto de desgraarem a vida de boa parte da populao, poderemos conhecer revoltas sociais. Num sentido melhor, fazem sentido as palavras do editor da Carta Capital Mino Carta:”o golpe de uma quadrilha a servio da Casa Grande teve o condo de despertar a conscincia nacional”. Cuidado: uma vez despertada, esta conscincia pode alijar seus opressores e buscar um outro caminho.
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