Domingo, 25 de Maio de 2025
24/05/2017 5d3q4q
Na sociedade brasileira atual grassa uma onda de dio, raiva e dilacerao que raramente tivemos em nossa histria. Chegamos a um ponto em que a m vontade generalizada impede qualquer convergncia em funo de uma sada da avassaladora crise que afeta toda a sociedade.
Immanuel Kant (1724-1804), o mais rigoroso pensador da tica no Ocidente moderno, fez uma afirmao de grandes consequncias, em sua Fundamentao para uma metafsica dos costumes(1785): “No possvel se pensar algo que, em qualquer lugar no mundo e mesmo fora dele, possa ser tido irrestritamente como bom seno a boa vontade (der gute Wille)”. Kant reconhece que qualquer projeto tico possui defeitos. Entretanto, todos os projetos possuem algo comum que sem defeito: a boa vontade. Traduzindo seu difcil linguajar: a boa vontade o nico bem que somente bom e ao qual no cabe nenhuma restrio. A boa vontade ou s boa ou no boa vontade.
H aqui uma verdade com graves consequncias: se a boa vontade no for a atitude prvia a tudo que pensarmos e fizermos, ser impossvel criar-se uma base comum que a todos envolva. Se malicio tudo, se tudo coloco sob suspeita e se no confio mais em ningum, ento, ser impossvel construir algo que congregue a todos. Dito positivamente: s contando com a boa vontade de todos posso construir algo bom para todos. Em momento de crise como o nosso, a boa vontade o fator principal de unio de todos para uma resposta vivel que supere a crise.
Estas reflexes valem tanto para o mundo globalizado quanto para o Brasil atual. Se no houver boa vontade da grande maioria da humanidade, no vamos encontrar uma sada para a desesperadora crise social que dilacera as sociedades perifricas, nem uma soluo para o alarme ecolgico que pe em risco o sistema-Terra. Somente na COP 21 de Paris em dezembro de 2015 se chegou a um consenso mnimo no sentido de conter o aquecimento global. Ainda assim as decises no eram vinculantes. Dependiam da boa vontade dos governos, o que no ocorreu, por exemplo, com o parlamento norte-americano que somente apoiou algumas medidas do Presidente Obama.
No Brasil, se no contarmos com a boa vontade da classe poltica, em grande parte corrompida e corruptora, nem com a boa vontade dos rgos jurdicos e policiais jamais superaremos a corrupo que se encontra na estrutura mesma de nossa fraca democracia. Se essa boa vontade no estiver tambm nos movimentos sociais e na grande maioria dos cidados que com razo resistem s mudanas anti-populares, no haver nada, nem governo, nem alguma liderana carismtica, que seja capaz de apontar para alternativas esperanadoras.
A boa vontade a ltima tbua de salvao que nos resta. A situao mundial uma calamidade. Vivemos em permanente estado de guerra civil mundial. No h ningum, nem as duas Santidades, o Papa Francisco e o Dalai Lama, nem as elites intelectuais mundiais, nem a tecno-cincia que forneam uma chave de encaminhamento global. Abstraindo os esotricos que esperam solues extra-terrestres, na verdade, dependemos unicamente da boa vontade de ns mesmos.
O Brasil reproduz, em miniatura, a dramaticidade mundial. A chaga social produzida em quinhentos anos de descaso com a coisa do povo significa uma sangria desatada. Nossas elites nunca pensaram uma soluo para o Brasil como um todo mas somente para si. Esto mais empenhadas em defender seus privilgios que garantir direitos para todos. Est aqui a razo do golpe parlamentar que foi sustentado pelas elites opulentas que querem continuar com seu nvel absurdo de acumulao, especialmente, o sistema financeiro e os bancos cujos lucros so inacreditveis.
Por isso, os que tiraram a Presidenta Dilma do poder por tramoias poltico-jurdicas, ousaram modificar a constituio em questes fundamentais para a grande maioria do povo, como a legislao trabalhista e a previdncia social, que visam, em ltimo termo, desmontar os benefcios socias de milhes, integrados na sociedade pelos dois governos anteriores e permitir um ree fabuloso de riqueza s oligarquias endinheiradas, absolutamente descoladas do sofrimento do povo e com seu egosmo pecaminoso.
Contrariamente ao povo brasileiro que historicamente mostrou imensa boa vontade, estas oligarquias se negam saldar a hipoteca de boa vontade que devem ao pas.
Se a boa vontade assim to decisiva, ento urge suscit-la em todos. Em momento de risco, no caso do barco-Brasil afundando, todos, at os corruptores se sentem obrigados a ajudar com o que lhes resta de boa vontade. J no contam as diferenas partidrias, mas o destino comum da nao que no pode cair na categoria de um pas falido.
Em todos vigora um capital inestimvel de boa vontade que pertence nossa natureza de seres sociais. Se cada um, de fato, quisesse que o Brasil desse certo, com a boa vontade de todos, ele seguramente daria certo.
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